Office in a Small City por Edward Hopper

O fim dos livros

… que acontecem

Duelo de gigantes: de um lado, Philip Roth dizendo que o livro vai acabar; do outro, Paul Auster dizendo que o livro não vai acabar. Os especialistas falam em convergência, isto é, o livro à moda antiga convivendo com os e-readers. Enfim, não sou eu quem vai profetizar nada, e pouco me importa que parem de publicar livros desde que eu possa continuar com os meus, longe daquela polícia sinistra de Ray Bradbury, queimando-os aos 451 graus Fahrenheit. O mais comum na Era Contemporânea é errar nas previsões. Adivinhar o quê? Se não acertamos futurinhos tão próximos, com elementos bastante possíveis… – como o fenômeno Facebook, que tem menos de 10 anos e passou despercebido até sua recente e súbita dominação global. É por isso que não aposto nada nessas tendências, palpites para daqui a algumas décadas, por exemplo. (Meus colegas do Marketing é que são os mais indicados para se curvarem sobre a bola de cristal.) Mas entendo, por lógica, que se houver, mesmo como minoria, amantes dos livros, as leis de mercado, dentro de seu normal, irão propiciar a continuidade de sua produção. Se não, não. E o mundo continua muito bem, com isso ou sem isso, assim como vivemos muito bem sem rolos de pergaminhos, papiros e palimpsestos. Meu amigo Fernando, que aliás é da área da Economia, não da Literatura, e por isso mesmo tem mais mérito como leitor e entusiasta desse vício, me ensinou que não devemos ser escravos dos livros, eles é que devem ser nossos escravos. Ele costuma riscar páginas para marcar trechos, deixar os livros abertos, virados para baixo, no quarto-escritório onde lê, deitado no chão de carpete duro, junto a suas amigas almofadas, sem se importar se com isso vai forçar-lhes a lombada, a cola ou a costura, enfim, sem se importar com esses objetos que de alguma forma amamos. Na verdade, eu e o Fernando temos algo mais em comum, porque não damos a mínima para os currículos dos autores, como é típico de nossos respeitáveis conterrâneos – se o fulano ou a beltrana publicaram tantos e tantos livros, se ganharam tais e tais prêmios, nada disso tem valor para nós. O motivo é muito simples: quando se pega a ler uma dessas brochuras, caímos num tédio quase orgânico, melhor dizendo, os livros desse pessoal são uma chatice. O que importa, para nós, é o resultado. E se você parou na pagina 5, não é porque seja um mau leitor, mas é porque esses livros não são interessantes mesmo, como se poderia esperar de autores desinteressantes. A carreira e o currículo desses escribas em questão, alguns até consagrados entre nós, não podem nos salvar do tédio. (Geralmente, eles se queixam de que os jovens não gostam de ler.) Então, quer saber? Para o bem da literatura, pelo amor ao prazer da leitura, o melhor mesmo é atirar o livro a um canto, o oposto do que faríamos com os inspiradores textos de Roth ou de Auster. O que me faz lembrar do que Paul disse numa entrevista a respeito de Philip, o rabugento que preconiza o fim dos livros: que o livro não vai acabar nada, e que nós vamos querer continuar lendo todos os romances que o Philip escrever. Isso aí, Paul. Eu também quero.

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