Office in a Small City por Edward Hopper

Varela – Noturno

fagundes varelaConsiderado um poeta de transição entre os ultrarromânticos e a terceira e última geração do Romantismo, Fagundes Varela abandonou a faculdade de Direito no último ano, passando a viver à custa dos pais, que representavam duas ricas famílias do Rio de Janeiro. Muito jovem, casou-se com Alice, filha do dono de um circo. A morte de seu primeiro filho, Emiliano, levou-o a um estado de angústia deplorável e inspirou o longo e sentido poema “Cântico do calvário”, no qual se lê: “Última rosa / que neste solo ingrato vicejava! / Última esperança amargamente doce!”. Pouco depois, perdeu também a esposa e alguns amigos próximos, como Castro Alves, o que agravou sua desesperança e fez dele um boêmio sem planos, passando a embriagar-se compulsivamente, vício do qual não mais se libertou. Conta-se que, em um desses episódios de embriaguez, foi recolhido das ruas por policiais que o encaminharam à delegacia, e que o delegado, vendo o rapaz naquele estado de ruína, quase não acreditou, ao registrar seu nome na ocorrência, que se tratava do brilhante Fagundes Varela, pois ali mesmo havia uma estante com a obra do poeta, de quem esse oficial era leitor e grande admirador. O trecho escolhido é um fragmento do poema “Noturno”, no qual se observam seu grande poder vocabular ao sugerir imagens fortes, sua sensibilidade e sua precisão artística ao compor cada estrofe. Varela faleceu em consequência de um AVC, aos 33 anos.

Minh’alma é como um deserto
Por onde romeiro incerto
Procura uma sombra em vão;
É como a ilha maldita
Que sobre as vagas palpita
Queimada por um vulcão!

[…]

Minh’alma é como o rochedo
Donde o abutre e o corvo tredo
Motejam dos vendavais;
Coberto de atros matizes,
Lavrado das cicatrizes
Do raio, nos temporais!

Nem uma luz de esperança,
Nem um sopro de bonança
Na fronte sinto passar!
Os invernos me despiram,
E as ilusões que fugiram
Nunca mais hão de voltar!

Fagundes Varela, “Noturno”, em Cantos meridionais, 1869.

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