Office in a Small City por Edward Hopper

Categoria: Inconsistência dos retratos

  • Sobre “Vencidos, uma questão de tempo”

    O conto “Vencidos, uma questão de tempo” trata de três jovens soldados encurralados em um apartamento semidestruído no que restou de uma cidade bombardeada. “Se vou morrer hoje, tudo bem, eu pensava. Só o que me trazia um incômodo nervosismo era imaginar como morreria. Um só daqueles mísseis, se atingisse o apartamento, se atingisse, digamos, o centro…


  • Sua canção de enganar (trecho)

    Texto apresentado no sarau da UEI (Sarau das tribos), julho 2019. Difícil é descobrir onde. É descobrir como. O que engendrou o erro, quando você parecia perto de possuir o mundo por causa de sua coragem. E por causa do amor. Parecia fácil. E o mundo, para cada um, sempre foi só até onde se…


  • Sete anos em Manhattan (trecho)

    Por vezes não sabemos por que fazemos algo.Mas um dia alguém descobre por nós. Encontrava-se ali, em minha casa moderna e espaçosa, esse velho e querido amigo, Robinson, desaparecido há tempos: desaparecidos nós dois, um para o outro, enquanto o tempo se deslocava entre chegadas, partidas e naufrágios. “Robinson, mal acredito que o estou vendo…


  • Inconsistência dos retratos, algo sobre

    Os textos que compõem esta coletânea datam do mesmo período em que surgiram aqueles que deram origem a Lisette Maris em seu endereço de inverno. Selecionados sob outro critério, não pretendiam (nem poderiam) caracterizar um volume conceitual, considerando-se sua diversidade temática e (nem tanto, afinal) estilística. Alguns destes contos assumem, no processo de sua narrativa,…


  • Inconsistência dos retratos. Adicional

    Sete anos em Manhattan Eu havia reencontrado um amigo dos tempos de escola, numa livraria, mas ainda não fora esse episódio isolado, inicialmente desprovido de maior significado, o que deflagrou a ideia do conto. Em outro momento, fiquei pensando na vida de todos nós, filhos do capitalismo, das ilusões materiais e das ideologias que nos…


  • Invasão (busca e apreensão) para nosso bem

    Invasão (busca e apreensão) para nosso bem

    Patrícia atreveu-se a perguntar: “Vocês são os famosos nazistas?”. “Claro que não”, disse a mulher, mal-humorada. “Mas temos aliados por toda parte.” Entraram sem muito alvoroço, eram apenas ordens, não tinham nada a dizer. Mesmo assim, não pude evitar surpreender-me: homens fortemente armados, fuzis de repetição, alguns mais ao fundo carregando pesados explosivos, uniformes de…


  • Os amantes das irmãs Novaes

    Os amantes das irmãs Novaes

    Recordações autônomas, indesejadas mas inevitáveis, como a gaveta do criado-mudo em que seu pai guardava o revólver. Entre eles, também havia o predileto. Elas o dividiam. Nunca houve questão quanto a isso. De resto, não era de se esperar que duas estudantes vindas da capital, hoje ocupando um discreto apartamento na parte alta do bairro…


  • O inverno segundo teu semelhante

    O inverno segundo teu semelhante

    Em um mundo onde as coisas tendem à dissolução, onde o tempo e a morte minam o rosto das pessoas e as arrastam em seu torvelinho cotidiano de estranhas situações, no meio de tudo, um menino pede socorro. Não há nada e nem pode haver algo mais caro ao ser pensante do que a vida.…


  • Eco, a cidade dos demônios

    Esses tais demônios vinham de uma estirpe que fora gerada entre velhos espelhos de um sótão, assimilando desde cedo travessuras desse tipo, brincando de refletir uns e outros em cacos irrecuperáveis. Como parte da rotina e invariavelmente, qualquer morador podia ver o senhor Antão Antônio de Deus pintando o muro de sua casa pela manhã,…


  • O beija-flor de Ruschi

    O beija-flor de Ruschi

    Não era meu o pecado, era dele, mas eu estava junto.Segunda-feira Desde que me dou por gente sou tratada que nem filha nessa casa. Porque nunca tive pai nem mãe e ninguém eles me criaram me deram roupa e comida e me ensinaram ler e escrever. Nunca me deram dinheiro mas nem nunca eu precisei.…


  • O Morro dos Lobos

    O Morro dos Lobos

    Na vila, todo mundo o conhece: o Quim da fazenda. Quim Bento, o bobão.Ninguém ficava imune ao sorriso em viés, aos desastrados acenos de braços curtos. Outro sobrevivente do massacre dos pioneiros. Do tempo em que eu, tolamente, acreditava poder ser um novo Guimarães Rosa. Mas não pode haver outro Guimarães Rosa. Nem outro Machado…


  • Peter Pan na toalha

    Peter Pan na toalha

    O preço que se paga por ser homem é a solidão.De outra forma esse homem transforma-se em cidadão, funcionário, pai e esposo, ou qualquer outra espécie de artigo devidamente catalogado. Um antigo conto que sobreviveu ao massacre dos pioneiros. Dos 20 aos 25 anos, escrevi uma quantidade de contos, movido por aquele impulso cego do…


  • Relógios

    Relógios

    Sobre a mesa tosca, os mecanismos desmontados aguardavam a vez de viver novamente.Numa estante de vidro, uns relógios recuperados sorriam horas exatas. Este foi meu primeiro conto publicado em livro, aos 21 anos, por meio de um concurso literário. Dá para sentir o amadorismo, a ingenuidade, a linguagem convencional, pretendendo ser a melhor possível. Na…


  • Guia de mistérios urbanos

    Guia de mistérios urbanos

    Que fenômenos são esses? E por que se ocultam em meio ao caos das grandes cidades? Talvez, como nas bibliotecas, a milhares de páginas significativas faltem ainda a faísca de uma necessidade ou de uma teimosia que as desperte. “[…] o universo é comparável a essas criptografias nas quais não valem todos os símbolos e…


  • Depois de toda glória, é preciso voltar

    … que acontecem Meu primeiro prêmio literário. 21 anos. (Não é essa foto aí, não.) Uma lembrançazinha que… Pensando bem, nada mais do que isso, quando muito. Mexendo em meus livros (meus mesmo, com textos meus), reencontrei o modesto Dez contos sobre o trabalho, livro fininho, com apenas dez contos – como, a partir do…


  • A onda dentro de um vidro

    A onda dentro de um vidro

    Todas essas imagens e fatos mal explicados criavam uma atmosfera incômoda de mistério e impotência diante de alguma resposta inacessível. Creio que aí teria começado em mim uma necessidade muito intensa de conhecer a verdade. O mar às vezes é cinzento. Claro que sim. Você não sabia? Sei do que estou falando. Nossa cidade fica…


  • Inconsistência dos retratos

    Inconsistência dos retratos

    Lamentando, de certa forma. Ou sorrindo em silêncio, alguma ternura ou Sempre vivenciamos muito mal nossos verdadeiros tesouros, daí por que um dia acabamos por perdê-los. Janela do vagão, vento em meu rosto, fios de meus cabelos grisalhos, eu procurando concentrar-me no que lia, mas a cada cinco minutos voltava o livro ao colo e…


  • Não são estas as minhas certidões

    Não são estas as minhas certidões

    Porque às vezes tenho pena de minha inocência. Tenho pena de meus sonhos. Deixava meu nome inteiro. Meu nome completo, com esmerada caligrafia. “Tem certeza?” “Como, se tenho certeza? Claro. Sem dúvida.” “Não são? Tem certeza mesmo?” “Claro. Claro que não. Quero dizer, não são. Não são as minhas. Sei muito bem quem eu sou.…


  • A sereia suicida

    A sereia suicida

    Andersen já começa a punir sua personagem com um recado claro e sinistro de que não há margem para o fracasso. De que o preço é alto quando se trata de desobediência. “Por que se diz afogar, como em: ‘Houdini morreu afogado’? Afogado não é quando se morre queimado? Com fogo? Afogar não é com…


  • Constanza

    Constanza

    Depois, as agruras da vida, em forma de uma bruxa má, passam a alimentá-los dia após dia, mas de outra maneira: fazendo-os inchar e engordar, com a intenção declarada de devorá-los em breve. Eles estão presos. Estão casados. Constanza é a minha amiga imaginária. Mas é claro que ela existe. Não, não é nenhum fantasma…


  • O dia e a noite sobre as estações

    O dia e a noite sobre as estações

    Vi meus próprios olhos olhando-se a si próprios, por dentro e de frente. E impressionei-me com um homem baixo e franzino que fechava a última porta da história, dizendo: “Acabou.”. Para iludir minha desgraça, estudo. Intimamente, sei que não me iludo. – Augusto dos Anjos, Poema negro 1 Três horas. Está certo. Está sempre certo.…


  • Paixões e fugas (A paixão segundo três estudos)

    Paixões e fugas (A paixão segundo três estudos)

    Chuva fina, outra manhã. Ouço os cascos e as rodas das charretes nas ruas molhadas, vou sob os toldos que mal me protegem. Esta, a cobiçada cidade onde convergem os artistas. Pintam repetidamente suas vilas, becos e calçadas. Mas eu, que faço aqui?


  • Anabel em seu dia de luz

    Anabel em seu dia de luz

    Quando perdi minha filha, pensei que jamais conseguiria escrever sobre ela…


  • As sombras

    As sombras

    Parei para ler o que havia nas mãos de alguns e espantei-me, porque ali se resumiam os pensamentos que ocupavam suas mentes e eram as chaves de suas almas. Li sonhos absurdos, planos criminosos, memórias, esperanças. Em muitos encontrei paixões sem sentido, vergonhas, frustrações, cartas suicidas, segredos de família…


  • Vencidos, uma questão de tempo

    Vencidos, uma questão de tempo

    Se vou morrer hoje, tudo bem, eu pensava. Só o que me trazia um incômodo nervosismo era imaginar como morre­ria. Um só daqueles mísseis, se atingisse o apartamento, se atin­gis­se, digamos, o centro da sala, não me daria tempo para um úl­timo suspiro. Força de expressão, claro: por que eu haveria de querer um último…


  • O cavaleiro do século

    O cavaleiro do século

    Alguém, não me lembro quem, disse que eu não passaria desta noite. Mas não é por isso que me encontro imobilizado nesta cama. Não é por isso que não me levanto daqui. Eu nem estou doente. Não passaria desta noite… Não me lembra quem.


  • Pai a casa torna

    Pai a casa torna

    Olhe, olhe só para isso: as flores ainda estão aqui. Sei que não são as mesmas, mas são da mesma espécie. Os outros novos moradores as preservaram de alguma forma, olhe só. Ou foram replantadas mais tarde. Ou… Sei, sei, já vi o degrau. Eu o conheço muito bem. E não estou brincando, você sabe.…


  • O mar dos meninos

    O mar dos meninos

    Como a toda criança aparentemente sadia, o mar e os navios encantavam-me. Nunca tinha visto um, nem mar nem navio, fora dos livros ilustrados em que os descobria. Desde aquelas antigas embarcações egípcias, passando por caravelas enfunadas e vapores ruidosos, até encouraçados em guerras mais recentes (até isso!), todos me pareciam belos.


  • Breve relato sobre o conhecimento de artes singulares

    Breve relato sobre o conhecimento de artes singulares

    No momento de embarcar, tudo sucede festivo e como nos atirássemos à mais gratificante aventura. Os companheiros nos acenam: “Vamos! Vamos!”, e eis o mundo de grandes portas abertas, de sorte à frente, tudo nos excita e convida ao futuro, menos o receio de acabarmos num dos quatro abismos que delimitam os mares e onde…


  • A moeda de milhões

    A moeda de milhões

    Incontáveis são as sutilezas que envolvem a sexualidade humana, não menos que as grosserias, os desejos inconfessáveis, as taras dissimuladas, as distorções e excentricidades, os tabus subvertidos, as violações à força, a infidelidade camuflada em velhas arcas de família, por vezes deflagrando episódios de paixão doentia, obsessões incuráveis e crimes violentos, porém só um leve…


  • Sua canção de enganar

    Sua canção de enganar

    Que lhe importam a Coluna de Trajano, as sagas contadas, gravadas em relevo, se sua vida é uma única peça, um único bloco onde se insculpem fragmentos com tudo o que lhe coube viver? E você sabe, como todos, que não pode estar antes nem depois da vida. Só aqui, em meio ao dia, tudo…


  • Sete anos em Manhattan

    Sete anos em Manhattan

    Por vezes não sabemos por que fazemos algo. Mas um dia alguém descobre por nós. E quantos, como eu, não teriam buscado respostas para a vida? – o que afinal significa buscar respostas para si mesmos. Tenho a sorte de reter muitas lembranças, o que tanto me serviu quanto me prejudicou.