Office in a Small City por Edward Hopper

Tag: romance

  • Não há linhas retas até Estela

    Tantas vezes se deu com habilidade a associação de uma dezena de símbolos somente para se constatar que era tudo falso ou tão verdadeiro que não necessitava dos textos, das telas e das partituras, que só o que sempre buscamos é o orgasmo e talvez o amor, esta palavra, apesar de suas estranhas variações. Tantos…


  • Big Bang, celenterados e filhas mulheres

    Meus amigos, as palavras podem mudar o mundo. Mas não muito. Esses nomes são inofensivos. Então, quando essas moléculas estavam se agregando, havia ali o espírito divino fazendo tudo acontecer, mas como o movimento era aleatório, não era preciso que alguém fizesse algo acontecer, elas se agrupariam do mesmo jeito, outra coisa, o que havia então…


  • Sonho do rio antigo

    Bem agora, enquanto nos observa, está pensando na organização da matéria, apostando que a vida busca aperfeiçoar-se, tornar-se complexa, alcançar a consciência e o conhecimento. Concluindo por fim que o homem é o produto da natureza sobre si mesma. E a consciência, a ferramenta com que o universo procura interpretar-se. “Vocês se parecem com Pablo…


  • E a máquina de escrever?

    Em companhia de mulheres, a rendição ronda os ombros de todos ali como delicados fantasmas. Essas criaturas podem, com um beijo bem dado, afastá-los de qualquer magnífico ideal humano.. Adultos, hein? Jesus, Fernando Pessoa e os Beatles não eram tudo, quem diria. Não foi tão doloroso assim afinal. A juventude se recupera rápido de tais…


  • Os extremos do grande sonho

    Isso era viver, ruas e trânsito humano, reconhecendo a repetição de incontáveis situações diárias sobrepondo-se a um passado acumulado no irreal, no insólito… Tornava a sentir-se respirando e andando, mãos retesadas contra a naturalidade dos movimentos, sangue cegamente visitando cada porção do corpo, isso era viver, ruas e trânsito humano, reconhecendo a repetição de incontáveis…


  • O rival de Churchill

    O rival de Churchill

    Reúne-se com amigos da mesma laia. Todos querem escrever alguma coisa, ninguém sabe por quê. A… CRI… SE… DO… MU… MUN… DO. Muito bem. Titulo sem erros. Centralizado. Conta os toques da linha, subtrai cada letra e espaço do que haverá de ser escrito, divide por dois, conta de novo… Perfeito. A crise do mundo: uma…


  • Música, ruídos: oásis e desertos

    Em contrapartida às considerações abrangentes, amplas, exteriores, opunha-se talvez uma certa necessidade de voltar-se ao centro, à unidade, que era de onde partia qualquer ideia do mundo. Bar do Tomás, depois o Oásis. Como sempre. Cerveja. Vodca. Rostos e corpos, mulheres ainda atraíam seus olhos, obscuramente. Música, breves sinais de bem-estar, mesmo assim sem o…


  • Outra das mil noites

    Receava que qualquer alteração pudesse interferir nessa surda harmonia matinal, quebrando sutilmente o feitiço. Que feitiço? O que era aquilo? Cedo demais para saber. “Assim… Mais forte…”, ela agora menos constrangida, menos hesitante, falando em outro tom, outra fluência. Que vida, não? Ele imaginava que alguém pudesse deliciar-se com sexo a noite toda. Ou o…


  • O que restou de sua grande e última decisão

    O dia que não tencionava viver. Um dia, apenas. A diferença entre tudo. Um dia todo se passara desde o veneno da véspera. Um dia todo para morrer. E fracassara. Quando conseguiu despertar novamente, sentiu como se apertassem suas têmporas com uma morsa. Veias latejando junto ao ouvido. Tonturas. Pontadas no cérebro. Dormira todo o…


  • Um título para isto

    Sempre essa miserável necessidade de ser amado por desconhecidos. Por uma legião de fantasmas que o julgam. O livro foi parar numas poucas livrarias, dois ou três exemplares em cada uma. São pontos de venda modestos, mal situados, pouco visitados, e A canção de pedra não se encontra exposta em nenhuma das vitrines, como o…


  • Senhores de tudo (e agora abençoados)

    E tudo se passa com tal naturalidade que nem mesmo os poetas se incomodam mais. E fazem versos sobre a nudez dos que amam, a sensualidade dos corpos, a solidão da alma e o antigo fato de não saberem quem são. Os bens da Terra, maiúscula mesmo, que é todo o planeta, e até agora…


  • A Noite das Vitaminas

    As venezianas denunciavam vagamente a altura do sol. Outra manhã. Mas não foi isso que o moveu à irresistível lassidão, o que lhe passou outra amostra da morte sob o peso de um sono extraordinariamente profundo. A água corria há algum tempo. Umafr est adec onsci ênci aof erec ia-l he out ravezu ma ponte…


  • O otimismo dos honestos

    O boato sobre a/o amante do doutor Aguiar, juntamente com os/as possíveis clientes envolvidos nas fraudes, já havia chegado ao Iraque. Paralelamente, corria a suspeita de que os tais documentos não assinados referiam-se a uma mesma pessoa, usando nomes falsos, chegando a se supor que havia ali algum envolvimento de uma eventual amante do doutor…


  • O diário de um morto. 6

    O diário de um morto. 6

    Enquanto ando, fecho uma das mãos, sentindo-a firme e obediente à minha força, tendo a convicção de estar vivo a senti-la, constatando sua realidade no extremo de meu braço. Vivo e sei que vivo, o que não significa nada. Quero esquecer que tanto me lembro. Página 113. Cidades em ruínas, poetas mortos, tentativa obstinada. Sinto…


  • O diário de um morto. 5

    O diário de um morto. 5

    Estas mesmas ruas podem ter sido pântanos fabulosos onde os dinossauros ruminavam ervas. Sempre o mesmo lugar. Quanto tempo?. Página 81. Inseto e luminária, longa caminhada, pântanos com dinossauros. Lia à luz da luminária quando um inseto minúsculo voejou rumo à lâmpada e caiu morto sobre o papel muito claro. Tendo diante de mim o…


  • O sísifo da Rua Rocha

    O sísifo da Rua Rocha

    Enquanto isso, despertava, vestia-se, deslocava-se da precária pensão onde morava para o trabalho, contribuindo com a continuidade dos dias. Quando se deitava, percebia através das paredes a água vibrando macia dentro dos canos (que ele imaginava muito velhos) em direção aos reservatórios. Um ruído constante e quase secreto. Confundia as impressões que circulavam por seu…


  • O diário de um morto. 4

    O diário de um morto. 4

    A resposta a um enigma, quando encontrada, é sempre mais simples que o próprio enigma. Por vezes, simples demais, de uma simplicidade constrangedora, podendo ser resumida numa frase que surpreenderá a todos e chegará a ser infantil. Página 63. Identidade provisória, enigmas decifrados, relógios imprecisos, a garota grega, um pensamento simples. Meus dias escoam-se pela…


  • Dos males, o verão. Parte 6

    Dos males, o verão. Parte 6

    Encontro no bordel: novas esperanças O resto do dia, custou-me passar. Ao fim do expediente, perambulei um pouco pelas ruas até o cair da noite. Sentia-me fraco, com vertigens. Fui até um bar enfumaçado, no quarteirão de casas velhas, que serviam como prostíbulos, e meu coração encheu-se de esperanças. Entra-se por uma porta estreita de…


  • O diário de um morto. 3

    O diário de um morto. 3

    Eu que não espero nem avanço, antes de me deitar penso no que posso enquanto sou, dou corda ao relógio outra vez. A morte me orienta, me espanta e redime. Página 59. O imperador e o idiota, fósforo no passado, espectro de Munch, pessoas na esquina. Minha vida tem sido uma luta interior incessante entre…


  • O diário de um morto. 2

    O diário de um morto. 2

    Pode-se dizer que nossa consciência de mundo (e de universo) seja bastante desenvolvida com relação aos outros animais. De resto, em relação a quê? Página 55. Local de nascimento, questões de consciência, o alpinista. As pessoas têm de nascer em algum lugar, por isso estou aqui. Apenas isso. Não me ocorre nenhuma nação, povo ou…


  • De como perdemos Val

    De como perdemos Val

    A morte põe tudo em segundo plano. Os planos de todos em segundo plano. Porque todos os planos de todos não a levam em conta, e isso a ofende. “Oi! Fala, Souto, e aí, velhão?! Opa, quanto tempo, hein? E então? Quando é que nós vamos tomar uma?” “Dan, liga a TV.” “Como assim?” “Liga a…


  • O diário de um morto. 1

    O diário de um morto. 1

    Sei que os lugares existem independentemente de nós. Mas quando revejo um pátio, um ladrilho trincado, um tanque ou muro umedecido, sinto que os reinvento através de meus olhos, através do que me sinto sendo hoje. Ser o que sou hoje é a única maneira de revê-los. Página 27. Velha casa, sala de espera, chuva.…


  • O que fez com ela? – com o corpo dela?

    O que fez com ela? – com o corpo dela?

    Ela sente que uma única palavra pode quebrar o encanto. Pode estilhaçar a sequência do que vinha sendo exposto tão espontaneamente. “Quando lembro de outras namoradinhas que eu tive, quando penso na Regina e como era divertido ficar com ela no carro… Na Júnia, com aquele jeitinho dela de intelectual ativista, quando lembro de como…


  • O castigo de escolher

    O castigo de escolher

    Adivinha a solução do pesadelo. Não apenas desistir do mundo. Renunciar ao que é. Aqui está, Júlio, o momento que se aproxima, o que por fim o incita a mover-se pela última vez: o castigo de escolher. Por acaso, a TV. Cena de um filme que não tratava disso. A mulher que vivera todas as…


  • Nenhum gesto, nenhum grito

    Nenhum gesto, nenhum grito

    Ele por fim sorri com grande espontaneidade. Sorri como se… Muito interessante. Só agora me dou conta de que ele raramente sorria. Raramente sorria. Tal como o recordo. Sim, agora o percebo melhor. Agora, tão tarde. Nunca pensei que ele pudesse morrer, outro pensamento bastante tolo. Como estaria ele, eu pensava, numa noite escura e…


  • Acesso irresistível

    Acesso irresistível

    No fim, nunca soubemos o que lhe havia causado aquele acesso. O fato é que ele nos contagiou, nos pôs felizes por alguns minutos, irresistivelmente felizes. Por algum motivo, a rotina burocrática andava confusa, talvez o acúmulo de trabalho e o esgotamento natural, decorrentes de tais esforços contínuos, minassem o condicionamento dos funcionários, assim prejudicando…


  • Imagens recentes do funeral de Bruno

    Imagens recentes do funeral de Bruno

    Umas flores, lançadas com suavidade: o esquife descia ao som das últimas preces. Júlio não rezava. Não fingia. Aceitava as condições. Como não? Bruno. Vinte e cinco anos. O tempo não existe. E não existe mais para ele. Não os acidentes, Augusto. Não me incomodam os assassinatos, as tragédias coletivas. Mas a vertigem, meu caro,…


  • A eterna tolice de tentar

    A eterna tolice de tentar

    A súbita notícia ao fim daquela tarde cinzenta, a tarde de nuvens da qual ele jamais regressaria. Júlio apertou a gola do casaco. Aquele vento era irmão de chuvas. Nas escadas, ele lhe voltou. Em meio ao trabalho quase esquecido, o trecho em que soubera registrar sua solidão atravessara as barreiras insólitas do tempo para…


  • No tempo (e no templo) das enciclopédias

    No tempo (e no templo) das enciclopédias

    Não importa o que se faça de insano, alguém sempre corre o risco de aparecer numa enciclopédia. ALBINONI, Tomaso – compositor italiano (Veneza, 1671 – idem, 1750) Músico barroco que só se tornou conhecido do público cerca de duzentos anos após sua morte. Com relação à inumerável produção de alguns de seus contemporâneos, Albinoni escreveu…


  • Coisas não tão graves

    Coisas não tão graves

    Vanda, mais uma pessoa – e seu sonho de si, sua denúncia de fraude. Pareceu aliviada quando eu lhe disse que não estava magoado, apenas surpreso. Que não a censurava, e talvez fizesse o mesmo se me atraísse outra mulher. Ela tinha de escolher aquele lugar. Galerias, vitrinas espelhadas, lojas e lanchonetes, tudo o que…


  • Uma sombra a caminho

    Uma sombra a caminho

    Ali estavam as bonitas pernas de Lea, de proporções prontas a qualquer prova, o desafio velado à concretização de um desejo, às expectativas de um artista ou às expectativas masculinas apenas. Manhã de sábado, algum vento. Sol ameno, agradável. Temperatura de outono. Júlio respirava o dia como se todos os fantasmas se dissipassem de uma…


  • Voyager 2

    Voyager 2

    Será que ainda não contaram isso a ninguém? A jovem locutora à frente da tela sorri às vezes, irradiando encantos.Meus semelhantes seguem tranquilos, serenos e responsáveis como se cada um deles… “Boa noite, capital! Temperatura em declínio, deve cair mais amanhã. Esta é a estação mais alegre da cidade!” Todo telejornal tem um mapa-múndi ao…


  • Passeios, pensamentos, posições

    Passeios, pensamentos, posições

    Exageros à parte: podia haver algo mais perverso que a natureza? Suas relações de brutalidade, sua fome de preservar-se, ainda que para isso não apresente sequer um objetivo, uma razão que a justifique. Ela o arrasta ao centro, às lojas, às confecções. À papelaria. Os emblemas, as gravuras, os adesivos, os pôsteres, os cadernos. Os…


  • Competências, habilidades, trabalho em grupo

    Competências, habilidades, trabalho em grupo

    Sentada no carpete da sala, pernas cruzadas. Ela tem um caderno no colo, bate de leve com a caneta no joelho. Coça a cabeça com as duas mãos, revolvendo os cabelos atrás das orelhas. Franze a testa. Chupa a caneta. Ele se faz de preocupado. “Boa noite, capital! A máxima hoje foi de 15 graus,…


  • Sem ação, sem reação

    Sem ação, sem reação

      Mas não era difícil ver que eu andava abatido e indiferente. Nem o tombo do Expedito me havia entusiasmado muito. A única coisa diferente que me lembra haver marcado um desses dias foi quando o Heitor Expedito despencou da escadaria, logo após haver dito ao doutor Aguiar que num instante lhe traria uma tal pasta…


  • De intimidades e ousadias

    De intimidades e ousadias

    Já não tinha forças para dizer o que fosse, a palavra mágica que a tudo abrangesse. Olhos fechados, por um momento ele sentiu que sonhava com os livros. Júlio e Vanda acreditam, mas não ousam confessar, nem um ao outro nem a qualquer pessoa, que vivem uma grande paixão, assim evitando exposições inúteis, quando tudo…


  • Não foi tão ruim, mas foi ruim

    Não foi tão ruim, mas foi ruim

    Nós, gordos e magros. Gerações que se sucedem e se repetem. Gente entrando e saindo, gente sentada ou de pé. Dançando, bebendo. Beijando-se. Desaparecendo. Todos mais ou menos semelhantes, o que absolutamente não serve de consolo. Abriu a porta. Estava de preto. Maquiada, cabelos presos. Vestido curto, justo, fechado no peito até o pescoço, ombros…


  • Testamento entre suas últimas manias

    Testamento entre suas últimas manias

    Da última vez que estivera em seu apartamento, Júlio guardara a sinistra impressão de que os móveis, as coisas estavam todas no lugar como se há muito tempo ninguém morasse ali. A ordem especial que era a própria imagem do abandono, a ordem cheia de presságios de quem, absurdamente, esperava morrer. Não importa que tudo…


  • As folhas tenras da alface

    As folhas tenras da alface

    Quando pequeno, imaginava que as frutas e as verduras, ao contrário de nascerem animais ou gente, aceitavam ser o que eram para que eu as saboreasse à mesa. Possuí-la à sombra e à luz de Gauguin foi mais do que eu poderia esperar. Esse privilégio aumentava a dimensão de meu prazer, nem tanto por integrar-me…


  • À luz amarelada de Gauguin

    À luz amarelada de Gauguin

    À noite, alheia a tudo o que possuía, fecharia os olhos guardando-os mansamente como se antes deles, antes dela, nunca houvesse acontecido qualquer outra coisa. Júlio deliciava-se com o vinho branco. Os cubinhos de queijo também o comoviam com seu sabor, arrancando-lhe patéticos gemidos de satisfação. Só Vanda ele não havia provado ainda. Para começar…


  • Queijo, vinho e… “o disco novo dele”

    Queijo, vinho e… “o disco novo dele”

    Um ligeiro arrependimento de não ter sido um dia forte o bastante para lutar por Treze. E logo afastou esse pensamento também, chegando a achá-lo engraçado, até mesmo sem sentido, que coisa estranha é o amor. Este, o andar. Como um simples aviso pode me incomodar assim? Júlio comprimindo os lábios e girando a cabeça,…


  • A edificante manutenção do tédio

    A edificante manutenção do tédio

    Nunca tantos me aborreceram tanto em tão pouco tempo. E eu, que punha em dúvida minhas próprias opiniões, já não podia mais que desprezar as deles. Pradinho queria saber de minha volta à cidade. Atirei-lhe uma ou duas palavras que deveriam bastar, mas não: ele aproveitava tudo. “Não é todo mundo que suporta esta cidade.…


  • Por sorte, algo sobre o sábado

    Por sorte, algo sobre o sábado

    Contava os dias da semana tentando fixar na memória as feições de seu rosto que, por escapar-lhe à nitidez no princípio, quase o fizera acreditar que não estivesse apaixonado. Vanda chegara no outono especialmente para contagiá-lo com a nebulosa impressão de que alguma coisa, afinal, começava a dar certo. Contava os dias da semana, tentando…


  • Foi bom ela não ter vindo

    Foi bom ela não ter vindo

    Eu tinha a impressão de que Vanda se parecia com Bruno. Era despreocupada e sensual. Para minha sorte, talvez, ele conhecera Lea primeiro, ela que também merecia sem muito esforço a atenção dos homens, outro estilo de fêmea… Meia hora andando em círculos no saguão de entrada. Os mesmos cartazes revistos dezenas de vezes causavam-lhe…


  • Muito, muito desconfiados

    Muito, muito desconfiados

    “Quem irá controlar os mercados, as fusões, as evasões de capital, os destinos dos que trabalham? Quem será que vai nos esmagar?” Todos desconfiavam de minha sanidade mental. No mais, levando-se em conta as graves crises sucessivas que atravessam a nação, naturalmente meus colegas vivem tentando explicar por que vai tudo sempre tão mal, contando…


  • … e esquecer o resto

    … e esquecer o resto

    Ajude-me, se me distraio. Lembro-me de eu ter lhe perguntado as horas, ela disse apenas: “É mais tarde do que você imagina.”. Juntos até o fim da festa. Ninguém os incomodou, o que parecia incrível. Também não perceberam o avanço das horas. Assim são as festas. Não, a festa já não era a mesma. Uns…


  • Tudo porque eram as páginas de um homem

    Tudo porque eram as páginas de um homem

    Era apenas um homem. Mas era algo. Acreditava que o diário valesse por si só. Acreditava-se o que podia pensar, o que podia supor. Há algo de muito estranho em estar vivo. Haver vida. Tão desnecessário quanto não. Que mais você quer? Claro, nada a perder. A aventura está lançada, como qualquer moeda. E a…


  • Atrás de seu século, não existe nada

    Atrás de seu século, não existe nada

    Pressentia seu aspecto ruinoso, historiado talvez por lembranças cinzentas e esmagadoras. Parecia louco. E nunca o vira tão lúcido. Não as palavras. O olhar. Claro que me lembro. Tenho certeza. Foi a primeira vez que me defrontei com o que mais tarde chamaria minha loucura. Mas, entenda, não é uma crise avulsa, um mal-estar de…


  • Um e outro, dois lados da coisa

    Um e outro, dois lados da coisa

     Nem parecia a mesma da noite passada, a que lhe respondia movimentos ansiosos, transpirando impaciência. A placidez do sono, o casal lascivo. A inocência da morte. Os sintomas opressivos da crise iminente haviam implantado nele a impressão definitiva de ser, além de um homem, uma circunstância, uma peça provisória e frágil. Uma aparência insólita, efêmera.…


  • Girassol do mal

    Girassol do mal

    Demolido o bar de onde saíram, a própria cidade envelhecida de chuvas à margem de outra, num delírio surdo, mas vertiginoso, em que nada era ele. Disse que não falaria mais de Bruno, mas ele precisa voltar. “Júlio, eu estou dizendo: elas são umas taradinhas.” Ele não sabia de que mangas saíam as garotas que…