Encontro-me com o coordenador do curso no saguão de entrada da faculdade. Um saguão amplo, de teto muito alto, como complementando o efeito de uma arquitetura artificial, com gigantescos pilares logo à entrada, pontuando a escadaria. Tudo ali impressiona. Mas não surpreende.

“Isso tudo vai acabar”, diz o coordenador pensativo, sem olhar para mim, como se fitasse um horizonte que não existe lá dentro.

“Mas como?”, pergunto surpreso. “Há tantos alunos, tantos cursos…”

“Os templos de Luxor…”, ele murmura, interrompendo-se em seguida.

“Sim, eu entendo. Mas… tão rápido?”

Em sua gaiola, ali perto, sobre um balcão, nosso hamster costuma correr loucamente em sua roda. Nós o chamamos Hamster da Faculdade. Ele está nesse balcão, nessa gaiola, desde a fundação da instituição, que ninguém sabe ao certo quando foi. Nesse dia, inexplicavelmente, ele parou de correr.

O Hamster da Faculdade parou de correr, observo, dirigindo a mim mesmo esse comentário sem voz, assim confirmando algo em que eu não acreditava quando era mais jovem: que só conseguimos pensar por palavras.

“O padre Bartolomeu me disse que tudo isso vai acabar”, acrescenta o coordenador. “E que tudo depende de inspiração poética.”

Bartolomeu de Gusmão, reflito, com toda certeza. Claro que ele está falando do padre Bartolomeu de Gusmão. Não há a menor possibilidade de ser outro.

“Foi o que ele disse? Foi isso mesmo que ele disse?”, pergunto-lhe com grande interesse.

O coordenador continua olhando à frente, como se eu não estivesse ali. Nesse momento, em uma das paredes lisas, de grandes placas imitando mármore, passa uma silenciosa legião de guerreiros antigos, em agitados cavalos, a parede servindo como uma tela de cinema. Ele parece não notar isso.

“Sim. Foi o que ele disse. De hoje em diante, só abriremos vagas para aulas de inspiração poética.”

Volto-me para a mascote na gaiola. O Hamster da Faculdade volta a correr, ansioso, aflito, no limite de seu desempenho. Sem descanso, sem pausa.

Inconsistência dos retratos – Guia de leitura

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Imagem: Edward Hopper. Cidade carvoeira na Pennsylvania. 1947.