Office in a Small City por Edward Hopper

Categoria: Romance

  • Projeto esvanecendo-se. Um último aceno para nada

    Ela tentou um último aceno. Professor, só entre nós. Eu tive acesso a muitas informações sobre seu trabalho e…  Depois de consumado meu desligamento da universidade, com minha assinatura em três vias e minha indiferença em quatro dimensões, a Adelaide me acompanhou até o limite daquela divisão, uma porta de vidro grosso que abria um…


  • Projeto esvanecendo-se. Por causa de uma noite de chuva

    Os boatos tomaram a frente de tudo que se pretendesse interessante nos corredores da escola. Só eu não sabia dessa falação. Eu sabia muito bem o motivo da minha demissão. E não era esse. Não era digressão coisa nenhuma nem coisa nenhuma desse tipo. Tinha consciência de que não era um professor como os outros, muito…


  • Projeto esvanecendo-se. Como contar a ela?

    Certo, ela tinha razão. Quando estou irritado, estendo mais do que devo o que tenho a dizer, sempre torcendo tudo a meu favor, é claro. A Marjorie apenas repetiu a palavra. Digressão – e comprimiu os lábios em seguida, estendendo à frente o inferior mais que o superior, fazendo beiço a alguém invisível, simulando surpresa e…


  • Projeto esvanecendo-se. Dias antes, dias depois

    Todo dia nasce alguém. Este dia é o primeiro dia de alguém. Todo dia morre alguém. Este ainda em curso é o último dia de alguém. Para mim, só mais um dia infinito. De não nascer e de não morrer. Minha vida tinha se tornado estranha ociosa incerta opressiva, mas pela primeira vez interessante. Por…


  • Projeto esvanecendo-se. Uma garota como outras – só que não

    Você se parece com ela sim. Não é? Seus cabelos, seus olhos estreitos, essas covinhas aí. Eu mesmo não sabia ao certo o que era. … associando situações reais com minha memória de livros, com imagens míticas que eu guardava sem querer, revia os cabelos cor de areia da Josie e punha em seus lábios…


  • Projeto esvanecendo-se. Das coisas todas

    Marjorie era uma caçadora. Disfarçada pela etiqueta. Encoberta pelas vantagens dos bons modos. .  Ainda menino, gostava de escrever livros que não existiam, que não passariam a existir. Criava a história toda, mas não me animava a redigi-la. Adquiri o vício absurdo de associar livros às coisas que me pareciam importantes, referindo-me, por exemplo, ao…


  • Projeto esvanecendo-se. Cintilações que não podem ser

    Ela estava me contando coisas de suas experiências nas ilhas britânicas, onde tudo parecia ser melhor do que o que temos por aqui, pelo visto. Duvido. Não existem lugares sem tristezas. Nosso casamento era afetado por coisas pequenas, que a Marjorie invariavelmente exagerava. As crises recentes da humanidade não eram páreo para ela. Os mínimos…


  • Projeto esvanecendo-se. Eu não queria que isso acontecesse

    Ela é uma menina bonita, um pouco baixa, pequena, covinhas ao lado do sorriso. As gengivas superiores sempre aparecem um pouco quando ela sorri. … Saul Bellow certa vez escreveu que um pensamento de morte por dia nos poupa da psiquiatria. Eu, definitivamente, não concordo com ele… Meu envolvimento com a Joss Stone começou por…


  • Um carinho enorme por esta lembrança

    Percebi, emergindo de um sono breve e profundo, que estava amanhecendo. Eu retornava de uma noite de sonho. Vivia ainda um sonho estendido. Quando voltei de verdade ao consultório do doutor Stabile, inventei maneiras de lhe perguntar sobre a Josie. (Ele tinha outra funcionária agora, chamada Regina Mara, morena quarentona, maquiagem forte, franja na testa,…


  • Projeto esvanecendo-se. O sonho com a jovem calva

    Queria saber sobre a sensação de ser beijado daquela forma. O que aquilo significava? Quem poderia ser ela? Pense com calma. Não tem que responder agora. … Fernando Pessoa deteve-se na questão de não nos conhecermos, pontuando que esse dom (o de nos desconhecermos) é o que nos poupa de ver nos outros nosso próprio…


  • Projeto esvanecendo-se. Um stone outra vez a caminho

    Não importam as guerras mundiais, os conflitos sangrentos gerando refugiados… Para nós aqui, mimados pela ilusão da segurança, as proporções são pateticamente outras. Este caminho que agora estou fazendo vai dar na casa da Joss Stone. Ela mora num dessas apartamentículos, um conjunto residencial de predinhos de três andares, só escadas, uma dessas colmeias geometricamente…


  • Lançamento: A seta de Verena (2a. edição)

    O romance está sendo relançado, com nova diagramação, após a boa acolhida da primeira etapa dessa aventura editorial. Além da satisfação em ver a continuidade desse livro junto ao público, fica também a constatação de que uma boa história sempre envolve o leitor nesse outro mundo, que é o nosso, conduzido pelas surpresas da ficção…


  • A seta de Verena – Guia de leitura

    Capítulos Parte 1. Introdução. O fim (e seu avesso) 1. Guardo-o como quero 2. Meigos pastores, secretos assassinos 3. O fim (e seu avesso) 4. Duas linhas, literalmente 5. O Arsênio da editora circular 6. Meu amigo poeta-patriota 7. Consumação mínima 8. Beckett lhe dá as boas-vindas 9. Dilemas inofensivos, obsessões horrendas 10. Bom dia,…


  • Nada dos bolinhos mágicos

    A chuva fina e constante acalmava-me, como se me afagassem a mente seus ruídos ancestrais e repetidos ao infinito. Despertei à chegada de Mônica, a cópia da chave que eu lhe dera girando ruidosamente na fechadura, a porta rangendo ao abrir-se. Sentei-me na cama, ainda enrolado no cobertor. Ela trancou a porta por dentro. Parecia…


  • Sob a mira da arqueira real

    Sob a mira da arqueira real

    A neblina glacial e a fumaça escurecida, escapando de chamas invisíveis, misturavam-se no espaço. Então, em meio a tudo… Ainda nos degraus da escada, podia ouvir os poderosos acordes da Grande missa em dó menor, que alguém teria enfiado no aparelho. O casal de crentes! Só me faltava essa. Eles estavam sentados em minha cama,…


  • Depressa, o senhor não vê que eu estou fugindo?

    Que ao menos me sirva de lição. Minha única ficha, único tempo, minha única vida. Não posso parar agora. Tudo começou pela manhã, quando um dos pensionistas gritou-me, lá de baixo: “Cartão!” Era uma carta. Desci para pegá-la, voltei ao quarto. Rasguei o envelope, e meus olhos tremeram ao decodificar num relance as primeiras frases.…


  • A tentação de fraudar a própria história

    A tentação de fraudar a própria história

    Publicaram uma foto sua, cabeça ligeiramente torcida, fundo de estantes, em que se realçava, antes de tudo, a altivez afetada dos que se sonham gênios ou gigantes, e no fundo não passam de alongadas sombras de anões. A notícia da morte de Glauco Pinheiro de Pádua apanhou-me de surpresa e pôs-me estarrecido. Julguei que ele…


  • Propenso a fragmentar-se

    Propenso a fragmentar-se

    Até hoje, a literatura é uma maneira de desenvolver essa minha mesma miopia. Mas não sou um obcecado. Todas as artes me atraem, especialmente a música. Elevei ao máximo o volume do aparelho para ouvir a “Grande missa em dó menor”, de Mozart, não para fugir à realidade, mas para experimentar o caos. Toda espera…


  • Por favor, esqueça essa bobagem

    Por favor, esqueça essa bobagem

    – Tenho certeza de que já vi você antes. – Pode ser. Sim. Pode ser. Não sei. Nunca se pode ter certeza. Por um instante, como há muito não me acontecia, senti um pico de ansiedade, quase uma crise de desespero. Sabia que, se não tornasse a encontrá-la, teria uma longa noite de agonia e…


  • Fantasias da razão

    Fantasias da razão

    A livraria parecia lotada, mas o que havia, na verdade, era pouco espaço, daí a impressão. Verônica sorria entre umas amigas suas. Um rapaz de minha mesma altura, barba e óculos redondos. – Na sua opinião, por que o povo lê tão pouco? – Porque os textos não são interessantes. Porque não somos interessantes. “Do…


  • A arte é o cristal – o resto é a vida

    A arte é o cristal – o resto é a vida

    Em contrapartida às situações fortuitas que caracterizam o acaso das vidas humanas, inferi que a arte poderia ser a linha reta que corta, feito uma seta, os círculos do tempo, principalmente o labirinto de nosso século, infestado de burburinhos e mediocridade. A arte é o cristal. O resto é a vida. Será? A meu amigo…


  • Livre para fracassar

    Livre para fracassar

    Mônica me preocupava, como já disse. Escapava ao meu controle. Falava por si mesma. Quarto de pensão. Mônica sentada na cama, eu andando de um lado a outro. “Por que não se dedica a uma causa?” “Causa? Que causa, como assim? E por que faria isso?” “Há pessoas que se encontram, se realizam e até…


  • Não posso deixar que ela leia isso

    Não posso deixar que ela leia isso

    Eu não sabia o que dizer. Considerando seus olhos em lágrimas, os lábios mais inchados e bonitos, voltou-me à memória a manhã de chuva em que nos conhecemos. Eu escolhia verduras com grande dificuldade, ela se aproximou sem que eu percebesse. Ela estava ainda de avental quando cheguei ao apartamento. Ia sorrir, mas viu que…


  • Outra Plath: algo das raras imagens de Sylvia

    Outra Plath: algo das raras imagens de Sylvia

    Olhei para ela, muito interessado. Era incrível que lembrasse e dissesse coisas assim. Com os cabelos que usava por esses dias, assemelhava-se cada vez mais às raras imagens de Sylvia Plath. Sem a ajuda do patife que ela conhecia, acabei fatalmente diante do triunvirato inquisitório que seria a última etapa de meu destino até então,…


  • Outro Hugo: sensível e teimoso

    Outro Hugo: sensível e teimoso

    – Tudo bem, tudo bem. Não vamos falar nisso agora. O seu vício de metáforas e associações, como sempre. Você é incapaz de ver uma simples vassoura sem pensar que o tempo vai varrê-lo do mapa ou algo assim. – E você acha pouco? Hein? Abro a porta para Mônica. Ela usa um vestido insinuante…


  • Antes que o dia em questão me encontrasse

    Antes que o dia em questão me encontrasse

    Recordava a entrevista, que desastre tudo aquilo! Eles precisam de um redator profissional, isso é horrível. Eu acabava de perder o emprego. Saía do escritório para as ruas, pela última vez. As ruas de verdade, nada metafóricas. Durante muitos dias, errei pela cidade, ainda sem noção do que faria em seguida. Chegava a passar tardes…


  • Querida, eu posso escrever tudo

    Querida, eu posso escrever tudo

    Rodolfo tentava recompor-se, em vão. Lorena cobria os seios com os braços, enrubescida. Andressa, com uma calma maquiavélica, apanhou o telefone sem tirar os olhos de ambos. Cena seguinte. Rodolfo em sua casa, com Lorena. Lorena perguntou: “Tem certeza que ela não vai voltar mais cedo?” “Claro que tenho”, respondeu Rodolfo. “Fique tranquila. O cabeleireiro…


  • Projeto esvanecendo-se. Abertura

    Projeto esvanecendo-se. Abertura

    Dois loucos completos. Com todas as amenidades, todas as gentilezas, próprias de cada um. Dois loucos, cada um à sua maneira. Um, completamente lúcido; outra, propensa à perfeição. No último dia de 2004 eu estava fingindo esperanças e uma agenda de motivações que não existiam mais em mim. Tinha perdido todas as minhas aulas e…


  • O inverno segundo teu semelhante

    O inverno segundo teu semelhante

    Em um mundo onde as coisas tendem à dissolução, onde o tempo e a morte minam o rosto das pessoas e as arrastam em seu torvelinho cotidiano de estranhas situações, no meio de tudo, um menino pede socorro. Não há nada e nem pode haver algo mais caro ao ser pensante do que a vida.…


  • Um amigo, um favor

    Um amigo, um favor

    Danilo o olha com um silêncio emocionado. Já ia lhe dizer que amar é só uma das bobagens em que a classe média acredita. Verne se levanta, apanha o casaco. Começa a vesti-lo. “É isso então, meu velho. A gente se vê. Vamos marcar outro desses.” “Vamos sim. Você me faz esse favor então?”, Danilo…


  • O endereço real

    O endereço real

    Ouve o destravar da fechadura, o velho mecanismo de abrir e fechar que todos nós usamos todos os dias.Que usamos sempre para nós mesmos, de se abrir e depois se fechar. Liana espera à frente da porta, bolsa e pasta com papéis ocupando suas duas mãos. Um olhar sem vontade a qualquer coisa ao redor…


  • Papéis para Verne

    Papéis para Verne

    A vida é uma linha reta, sem volta. E a literatura é a única coisa que pode tornar tudo sinuoso. Disforme. Interessante. Mesmo que se confunda com a mentira. Na literatura, a mentira se chama ficção, você sabe. Val. Pensei que pudesse salvá-lo também, por meio da palavra, até mesmo por meio destas palavras horríveis:…


  • Os anjos da lei

    Os anjos da lei

    O vulto não se move. Não dá para ver bem o rosto, muito menos os olhos. A chuva fala por todos. Ainda abraçado a Liana, Danilo vê que é uma viatura da polícia. As lanternas intermitentes ferem com dificuldade o ar nublado pela chuva em curso. Parece-lhe inquietante o silêncio em torno de sua chegada:…


  • A cor intensa que nasce e morre com os humanos

    A cor intensa que nasce e morre com os humanos

    A era geológica presente terá mais um nome no futuro. Todos os crimes irão prescrever. O tempo esmagará os discos rígidos. Não haverá nada escrito nas nuvens. Dorme. Tenta dormir, por enquanto. Acompanhado, como sempre, como se dá com todos, de imagens e sons outra vez imaginados, a conhecida miscelânea que se vai confundindo nas…


  • Qualquer coisa triste é triste o bastante

    Qualquer coisa triste é triste o bastante

    O mundo também vai sumir. Com todas as palavras. De todas as línguas. Agora é noite, porque o planeta fez outro giro sobre si mesmo. Danilo escrevia. Uma atração muito forte pela palavra. Por signos linguísticos. Um fascínio por esses sinais carregando ideias, insinuações e até mesmo carregando o que não conseguem nunca significar. Isso…


  • Um estreito, fino rastro de sangue

    Um estreito, fino rastro de sangue

    Pensa nele com a impressão abafada de estar cedendo a uma armadilha invisível. Com essa dúvida sobre aquela morte antiga. Liana lia. Esse assunto lhe interessa cada vez mais. No fundo, não lhe interessava muito antes, ou quase nada. Nada que superasse a curiosidade momentânea despertada por alguma notícia espantosa, casos escassos, mas impressionantes: a…


  • Américo Cabral assombra em vida

    Diógenes pensa: a morte é um castigo? Ou um prêmio? Não, não. Pare, vamos parar tudo. Tudo, agora mesmo. O que é isso? Mal o assassino aparece, começa a filosofar? A bárbara violência sexual de que fora vítima Virgínia Morais O editor pediu-me pelo menos um crime ou uma cena de sexo ardente. Pessoas que…


  • Por onde as pessoas vivem…

    Por onde as pessoas vivem…

    Sonhei certa vez que encontrava, na caixa de correspondência, entre a profusão de papel picado, todas as cartas que enviara no decorrer da vida. Nada muito significativo. Apenas mais um pesadelo. Cartas que lhe escrevi foram destinadas a mim mesmo. Sonhei, certa vez, que encontrava, na caixa de correspondência, em meio a uma profusão de…


  • Modelos de cartas inúteis

    Modelos de cartas inúteis

    Entendo a morte, quase a aceito, como indivíduo, cidadão e animal. O que não deixa de ser notável, pois os animais não aceitam a morte. Sobre a paz e a justiça que você menciona, creio que a inteligência, e não o amor, é o que pode salvar a humanidade. As necessidades e conflitos que movem…


  • Quase sem rumo

    Na mesma manhã, ele se lembrava, em que ela em especial lhe sorrira, demorando-se a recolher os dentes sob os lábios dilatados, depois conservando o sorriso ainda na boca fechada, ele lhe fizera, em um guardanapo de papel, o seguinte desenho (com a correspondente inscrição): XÍCARAS A JATO VIAGENS FASCINANTES PODEM NASCER DO CAFÉ DA…


  • A esperança lhe arranha a testa

    A esperança lhe arranha a testa

    Primavera. Uma esperança, não é? Outro lapso, claro. Vamos, vamos. As esperanças não são nada, lembra? Dia de sol ameno, correntes menos frias e temperatura média, facilitando-lhe afastar pensamentos idiotas desagradáveis enquanto lhe proporcionavam pensamentos idiotas agradáveis. Agosto ia ao fim. Como parte da confusão climática que o planeta vivia nos últimos anos, a primavera…


  • Autocondenação e conflitos continuados

    Autocondenação e conflitos continuados

    Não há conclusões, mas continuidade. Nenhum conflito encontra seu fim, mas permanece para o decurso de outras vidas. O JOVEM QUE LÊ. Incluir alusões gráficas a frontispícios. Talvez festões. Isso! Bordaduras, volutas… Não, não exageremos. O jovem que lê, dar-lhe nome, desencadeia, com suas leituras, a morte, em circunstâncias misteriosas, dos autores. Os mais antigos,…


  • Um dado de um jogo de dados

    Desceu correndo as escadas, por pouco não tropeçando em Pablo e Cândido, que o fitavam com seu costumeiro sarcasmo de esfinge, incomodados por terem perturbado seu sossego. Você também provou de um veneno infalível, acreditou no que escrevi certa vez – o tempo todo em que estive sozinho à mesa deste café, revendo meu diário…


  • Dispensando a musa

    Dispensando a musa

    Que não se referia, afinal, a uma guerra qualquer, mas ao meu próprio massacre. O herói extraviado. Os livros. Meus registros. Cadernos (II) – por que romanos?: 2 Newton considerava perdido todo tempo que não fosse dedicado ao conhecimento, à ciência. Borges ficou cego; Beethoven, surdo. Bach e Kant moraram em cidades pequenas e raro…


  • A um passo de seu rosto

    Dedicava a ela, por mero machismo, o desfecho de seus duelos secretos. Sua parcela de ridículo triunfo. O bom menino em nome da classe humana. O fiel e medíocre representante da história e de tudo o que não queria mais representar. Desceram ao subterrâneo, deixando para trás o fim de tarde nublado. Junto à faixa…


  • Trogloditas bem-falantes

    Quase tudo o que pensamos e sabemos se dá por meio de palavras. O tempo passa. Essa ideia (não o tempo) necessita de palavras. “Ela era o sonho de todo homem: gostosa e burra. Você lembra? Ela ria de qualquer coisinha.” “Mas ela não era pro seu bico, era demais pra você.” “Dessas é que…


  • Perto daquela estátua estranha

    “Também uma exposição retrospectiva de contemporâneos no outro pavilhão, olha só.” “Estranho…” “Estranho o quê?” “Se são contemporâneos, como pode ser retrospectiva?” “Que bobo. Nossa, mas que bobo. Não sei por que perco meu tempo com você.” “É a primeira vez que você me telefona no escritório. A que devo esse prazer?” “Não seja cretino,…


  • Dois personagens sob a chuva

    Liana pensa ter visto um vulto de mulher à margem do acostamento. Não. Era o resto de uma árvore cortada. Liana longamente quieta durante a breve viagem. Monotonia da estrada conhecida, a cidade logo ali, no encalço de algumas colinas suaves, despontando em torres minúsculas, de um cinzento esmaecido, como desenhadas contra o fundo de…


  • Um rosto aos 25 anos

    Um ano além dos calendários previstos, que para ele passava a significar um século, uma espécie de período em que as horas não se definiam pela posição do sol, mas pela perspectiva de um encontro. Num momento de patético lirismo, lembrou-se do que uma vez havia escrito em seu diário sobre Vanda e as verduras,…


  • Deixando a fortaleza

      O motel que é como um pequeno castelo bem protegido. A fortaleza dos segredos íntimos e das necessidades sensuais, que a sociedade finge não existir com tanta força. “Passava da meia-noite. A faculdade estava deserta. Dava pra ver todas as janelas apagadas. Tirei a Ana… o corpo dela do carro. Deixei logo ali, sem…