Office in a Small City por Edward Hopper

Tag: contos

  • Dos males, o verão. Parte 8

    Qualquer homem se apaixonaria por ela Epílogo A miséria e a desgraça sempre existiram. A miséria e a desgraça sempre existiram. A miséria e a desgraça sempre existiram. Com tais palavras, comecei meu dia, repetindo-as metodicamente enquanto caminhava, tentando esquecer os tipos que me cercavam como num pesadelo. Sempre existiram, desde que começamos a nos…


  • Dos males, o verão. Parte 7

    Estrela em meio ao caos IV Quinta foi talvez o dia mais quente de todos. Um inferno. A primeira coisa que fiz, pela manhã, foi rasgar o papel com o verso sobre a morte ser um poço, desistindo de meu grande poema. Eu o havia esquecido ali em cima, completamente, nem pensava mais no assunto.…


  • Dos males, o verão. Parte 5

    Dos males, o verão. Parte 5

    Divagações com bolhas CAPÍTULO TERCEIRO (NO QUAL SE TRATA DESDE DIVAGAÇÕES COM BOLHAS A UMA DISCUSSÃO PARALELA DE ORDEM FILOSÓFICO-RELIGIOSA NUM BORDEL METROPOLITANO POUCO MOVIMENTADO) Pela manhã, jurei que não prestaria atenção aos ambulantes e desempregados que se multiplicavam pelas esquinas. Mas foi inevitável que ouvisse a voz arrastada de um sujeito moreno, sorriso matreiro…


  • Dos males, o verão. Parte 4

    Dos males, o verão. Parte 4

    Pior é não ser o fim Além dos camelôs licenciados, há também verdadeiras legiões de ambulantes, em cada ponto do centro. São jovens e velhos, desempregados ou aposentados, homens e mulheres de meia-idade, lutando como podem para sobreviver sob o sol desta terra, contra o verão infeliz de nossas cidades. Ficam de pé, abordando os…


  • Dos males, o verão. Parte 3

    Dos males, o verão. Parte 3

    A ameaça sombria de destinos possíveis Quando acordei, vi dois envelopes meio enfiados por baixo da porta, o que misteriosamente renovou-me uma centelha de esperança. Rasguei rapidamente o primeiro: Este é o momento ideal para você adquirir o nosso cartão de crédito… Depois, o segundo: Chegou a oportunidade que você tanto esperava para finalmente fazer…


  • Dos males, o verão. Parte 2

    Dos males, o verão. Parte 2

    O verso extraordinário Os santos não eram santos. Mas sendo essa a imagem que guardamos deles, ou melhor, que nos guardaram cabeça adentro, o importante é que nos inspirem. Há ainda homens que não são canalhas. Esses talvez pertençam àquela seleta galeria de sábios, meia dúzia deles, por assim dizer, que a cada geração sustentam…


  • Dos males, o verão. Parte 1

    Dos males, o verão. Parte 1

    Cordeiro, a salvação O que de mais belo conheci na Terra, Nathanael, é minha fome.  – André Gide, Os frutos da terra 1 Meu dinheiro acabou ontem. A cinco dias do salário. E o escritório não concede vales a quem quer que seja. Convenci a dona da pensão a também esperar mais uns dias, já…


  • O aniversário dos macacos

    O aniversário dos macacos

    Ele, uma criatura solitária, taciturna, alguém que diariamente assistia à dissolução da luz que parecia duradoura, à gradual escuridão da noite de todos os dias. Como seus parentes humanos, não sabia ao certo o que o incomodava quando envolvido com um desses momentos.Vinte e cinco anos, disseram. Uma aglomeração de visitantes festivos, que fizeram questão…


  • Raimundo Terra planeja seu suicídio

    Raimundo Terra planeja seu suicídio

    Atores, atrizes? Não passam de produtos, quem não sabe disso? Usados, como todos. Parecem deuses, mas têm intestinos.Selada a última carta, desce às ruas. O apartamento, trancado pela última vez. Última, suspira. Tem o absurdo cuidado de levar o guarda-chuva, que uma garoa alternada com chuvisqueiros insiste sobre a cidade por esses dias. Próximo aos…


  • A menos que se instalassem dois sóis

    A menos que se instalassem dois sóis

    Dia e noite poderiam ser suprimidos se o planeta não girasse, um acaso mecânico, nada é tão místico assim. Mas haveria, de qualquer maneira, um grande lado escuro e um grande lado claro… Da primeira vez que ouvira esse adágio, sem mesmo conhecê-lo por nome, tivera o intenso e grandioso desejo de que por toda…


  • O Morro dos Lobos

    O Morro dos Lobos

    Na vila, todo mundo o conhece: o Quim da fazenda. Quim Bento, o bobão.Ninguém ficava imune ao sorriso em viés, aos desastrados acenos de braços curtos. Outro sobrevivente do massacre dos pioneiros. Do tempo em que eu, tolamente, acreditava poder ser um novo Guimarães Rosa. Mas não pode haver outro Guimarães Rosa. Nem outro Machado…


  • Peter Pan na toalha

    Peter Pan na toalha

    O preço que se paga por ser homem é a solidão.De outra forma esse homem transforma-se em cidadão, funcionário, pai e esposo, ou qualquer outra espécie de artigo devidamente catalogado. Um antigo conto que sobreviveu ao massacre dos pioneiros. Dos 20 aos 25 anos, escrevi uma quantidade de contos, movido por aquele impulso cego do…


  • Nós, os fortes, te agradecemos

    Nós, os fortes, te agradecemos

    Uma maneira secreta de aceitar e negar a nitidez do mundo, seus perigos, seu silêncio. Os ruídos que o revelam antes da música. Olhando entre a noite e as grades do Orquidário e seu bosque, outra vez o que me invade ronda a alameda em perspectiva: postes de duas lâmpadas, sob globos sem rosto, bases…


  • (O sol na primavera desperta odores pestilentos…)*

    (O sol na primavera desperta odores pestilentos…)*

    Sinto a necessidade do registro, contra a crença geral de que todos os idiomas serão extintos. Talvez eu guarde, entre meus sonhos, uma resposta proibida. * Título convencionado para identificar o manuscrito que segue, reproduzido, tanto quanto possível, sem lacunas e integralmente. O sol na primavera desperta odores pestilentos, mefíticos, sei. Gases e oxidações de…


  • As duas vidas de Edmundo Campos

    As duas vidas de Edmundo Campos

    Fatias de mundo, história fragmentada (um dia apenas) em tantas cidades e países. Cristaliza-se o passado. Passado da humanidade, registro dos grandes eventos. A memória de cada pessoa. A literatura tem páginas de anjo, ratos sonhando, monstros melancólicos, outros nem tanto. – Very literary dreams, cap. II, p.11 (2a. edição, Vinci, 1766) Vera não o…


  • Os retratos de Marta Rosana

    Os retratos de Marta Rosana

    A sociedade, penso eu (mas não lhe digo), é basicamente formada pelos que se salvaram, inclusive da miséria. Os outros (que outros?) não provarão da aventura humana. Vamos entrar vamos entrar, diz o velho com certa impaciência. A onda aromática invade-me as narinas. Móveis antigos, o mofo das cortinas e o próprio velho causam-me certa…


  • O telefone pela manhã

    O telefone pela manhã

    Não, eu não lhe digo isso. Ele é que parece dizer-me. A racionalidade que faz de mim um homem prático parece não ter cura, leio em seus olhos. 1 Que iríamos passear, era sábado. O centro, uma quinquilharia qualquer. No centro, como você gosta. Você entende? Ele não responde. Desde que papai foi sepultado, três…


  • Relógios

    Relógios

    Sobre a mesa tosca, os mecanismos desmontados aguardavam a vez de viver novamente.Numa estante de vidro, uns relógios recuperados sorriam horas exatas. Este foi meu primeiro conto publicado em livro, aos 21 anos, por meio de um concurso literário. Dá para sentir o amadorismo, a ingenuidade, a linguagem convencional, pretendendo ser a melhor possível. Na…


  • A cidade de um país

    A cidade de um país

    Adentro a sala, tenho à frente a mesa dos conspiradores, entre eles seu poderoso líder. Acabo de ver seu rosto, e agora tenho de morrer. Caí na cilada e estou sozinho. Corro para o fundo, vejo que alguns deles saem pela mesma porta, sem a minha pressa. Eu, que sempre me envolvi em todas as…


  • A prometida história de fantasma

    A prometida história de fantasma

    Comentou que naqueles tempos as mulheres eram de verdade, sem truques nem retoques da tecnologia. Mas eu lhe disse que era ingenuidade dele, que os retoques existiam desde a invenção da fotografia. Só tinha ficado mais fácil. “Hoje à noite, então. Vou esperar.” Cerveja no meu apartamento, coisa à toa, mas o Paulo Marcos nos…


  • Óculos

    Óculos

    Meu irmão mais velho editou outro volume de contos. Ele tem a vista perfeita, imune a quaisquer desvios, todo ele é contrário a mim, sendo eu o único míope entre os irmãos, pretendendo ansiosamente escrever contos como ele, escondendo do mundo meus rascunhos secretos, envergonhado de minha vasta miopia, esmagado por minha impotência, enquanto tento…


  • Guia de mistérios urbanos

    Guia de mistérios urbanos

    Que fenômenos são esses? E por que se ocultam em meio ao caos das grandes cidades? Talvez, como nas bibliotecas, a milhares de páginas significativas faltem ainda a faísca de uma necessidade ou de uma teimosia que as desperte. “[…] o universo é comparável a essas criptografias nas quais não valem todos os símbolos e…


  • Últimas noites do burocrata obstinado

    Últimas noites do burocrata obstinado

    Novamente o sonho dos papeizinhos, e mal os sentia entre os dedos, escapando-lhe antes que pudesse recuperá-los e torná-los classificados aos seus devidos lugares, e essa agonia durou menos do que a outra. A noite seguinte trouxe-lhe pesados fichários que carregava com as duas mãos, porém algo inusitado e assombroso contrariava-lhe o ânimo e o…


  • Andante de um concerto barroco

    Andante de um concerto barroco

    A vida não é só para ser vivida, há algo mais que não compreendemos. Mas nada tão sério que não se possa atingir pela música. Como quando nos encontramos daquela vez, em casa de Ruth, sendo a noite a mesma, até a frequência da chuva parece reavivar minha memória daquela noite-hoje. Sim, mas vamos para…


  • Um par de amigos, um caso ímpar

    Um par de amigos, um caso ímpar

    Que isso? Que isso que a Nasa está explorando Marte, a Europa está quebrando a cara, o Supremo julgando a bandidagem da política, e você… você… “Não entendo, velho.” Meu amigo, o Paulo Marcos, havia comprado um par de sapatos que depois demonstraram não lhe ter servido adequadamente, ao contrário do que lhe pareceu ao…


  • A onda dentro de um vidro

    A onda dentro de um vidro

    Todas essas imagens e fatos mal explicados criavam uma atmosfera incômoda de mistério e impotência diante de alguma resposta inacessível. Creio que aí teria começado em mim uma necessidade muito intensa de conhecer a verdade. O mar às vezes é cinzento. Claro que sim. Você não sabia? Sei do que estou falando. Nossa cidade fica…


  • Sonho 3340. Umas ruas, uma cidade cor de areia

    Sonho 3340. Umas ruas, uma cidade cor de areia

    A rua tem um degrau. A partir desse degrau, torna-se outra rua, em outra cidade. Sinto que estou mais próximo do conhecido portão de casa, a casa onde vivi parte de minha conturbada infância. Meu pai, falecido há quatro anos, vai ao volante. Minha mãe, no assento ao lado. Eu, no assento de trás, mais…


  • Inconsistência dos retratos

    Inconsistência dos retratos

    Lamentando, de certa forma. Ou sorrindo em silêncio, alguma ternura ou Sempre vivenciamos muito mal nossos verdadeiros tesouros, daí por que um dia acabamos por perdê-los. Janela do vagão, vento em meu rosto, fios de meus cabelos grisalhos, eu procurando concentrar-me no que lia, mas a cada cinco minutos voltava o livro ao colo e…


  • Não são estas as minhas certidões

    Não são estas as minhas certidões

    Porque às vezes tenho pena de minha inocência. Tenho pena de meus sonhos. Deixava meu nome inteiro. Meu nome completo, com esmerada caligrafia. “Tem certeza?” “Como, se tenho certeza? Claro. Sem dúvida.” “Não são? Tem certeza mesmo?” “Claro. Claro que não. Quero dizer, não são. Não são as minhas. Sei muito bem quem eu sou.…


  • Constanza

    Constanza

    Depois, as agruras da vida, em forma de uma bruxa má, passam a alimentá-los dia após dia, mas de outra maneira: fazendo-os inchar e engordar, com a intenção declarada de devorá-los em breve. Eles estão presos. Estão casados. Constanza é a minha amiga imaginária. Mas é claro que ela existe. Não, não é nenhum fantasma…


  • O dia e a noite sobre as estações

    O dia e a noite sobre as estações

    Vi meus próprios olhos olhando-se a si próprios, por dentro e de frente. E impressionei-me com um homem baixo e franzino que fechava a última porta da história, dizendo: “Acabou.”. Para iludir minha desgraça, estudo. Intimamente, sei que não me iludo. – Augusto dos Anjos, Poema negro 1 Três horas. Está certo. Está sempre certo.…


  • Sonho 1128. A pedra de atrito

    Sonho 1128. A pedra de atrito

    Então ele se deita no chão, com o rosto entre os braços, e irrompe a chorar convulsivamente, como uma criança. Eu me aproximo, querendo saber o que aconteceu. Meu amigo e eu caminhando por um bosque claro e tranquilo, árvores bem espaçadas, chão de folhas pardas, amarelas e cor de ferrugem, formando camadas de piso…


  • Queremos o fim do Quixote

    Queremos o fim do Quixote

    Sempre me impressionou muito que as pessoas andassem com calma – mesmo entre conhecidos e em suas próprias cidades. Também muitas vezes acreditei que a maneira de andar, assim como alguns gestos viciados ou cacoetes, fosse a sugestão de que a natureza orgânica começasse por eles a apresentação dos sinais de alguma desarmonia mais profunda.…


  • Registro de ciclos e movimentos

    Registro de ciclos e movimentos

    A Terra gira e recicla seus ossos. Há escombros impalpáveis, fendas na memória. Tantas vezes restaurada e ainda assim, na junção das hastes, o oliva-ferrugem, óxido de azuis na roleta que hoje conta os mortos. Junto ao orquidário, junto ao chafariz e ao banco de pedra, aqui onde me sentia seguro sem considerar o verdadeiro…


  • Chancelaria e viagem

    Chancelaria e viagem

    …seja este dia ou esta página, agora que tão intensamente atravesso as tardes de perdidas luminosidades, tão parecidas com a minha infância, de mesmo calor e mesmo incômodo, até finalmente intuir que um dos objetivos da vida é, magicamente, estar aqui. Medicamento sob prescrição médica, que diferença faz? Esbarro em tantos semelhantes sadios, mal os…


  • Nádia alcançada, meu último rosto

    Nádia alcançada, meu último rosto

    Senti as noites de minha juventude, o calor e o sereno de madrugadas sem fim, constatei prostíbulos que me escaparam às palavras enquanto os vivi e que não procurei resgatar na poesia das cartas. Identifiquei cada festa, cada momento de orgasmo e vertigem, cada solidão.


  • A casa e a célula

    A casa e a célula

    Claro que eu não poderia, nem deveria, aproximar-me de tal pensamento. Mesmo porque não o havia procurado, ele é que chegava até mim por meio das conclusões dela, que por sua vez pareciam ter-se originado de um sonho – para outros, talvez, um pesadelo. Na verdade, preocupam-me tentações desse gênero porque sei que sou capaz…


  • Cães de caça entre a Lira e Leão Menor

    Cães de caça entre a Lira e Leão Menor

    Eu olhava o cadáver: que fazer com esses restos? “Que fazer de vocês?”, eu o olhava. Trouxera-o de fora ao jardim dos fundos, já não podia voltar atrás. Terra ainda úmida, não seria difícil abrir uma cova precária, nem aquilo merecia mais. Logo voltariam a relva, as ervas rasteiras e umas flores inúteis, sempre casuais…


  • Cores, sombras: aquarela de passagem

    Cores, sombras: aquarela de passagem

    Minha lancheira encardida, ela com seus cadernos de classe empoeirados pelas quadras de terra que afastam a pequena escola, um galpão tosco e sem recursos que fica para mim tão longe, longe… É apenas o caminho de volta. Mas, aos seis anos, tudo é fascinante em qualquer caminho.


  • Cenas infantis

    Cenas infantis

    “É preciso ter coragem, lembra?” “Lembro, claro que sim. Mas parece que a coragem é uma qualidade dos sórdidos.” “Não importa. É preciso ter coragem de qualquer maneira. Noite alta, as casas fechadas. Sou apenas um corpo que anda. Por que a noite me aflige assim?” “Como posso saber? O que será para você talvez…


  • Engenho de limites

    Engenho de limites

    O luar quebrava o último ângulo dos ladrilhos. Na cama, eu aguardava o sinal sem fim das ausências, a bruma quase irreal que sucede as agitações em marcha, os pesadelos e os grandes conflitos, protegendo-me sob o cobertor como um menino se guarda sem seus anjos antes que volte vibrando, amplo e benigno, o trem…


  • Paixões e fugas (A paixão segundo três estudos)

    Paixões e fugas (A paixão segundo três estudos)

    Chuva fina, outra manhã. Ouço os cascos e as rodas das charretes nas ruas molhadas, vou sob os toldos que mal me protegem. Esta, a cobiçada cidade onde convergem os artistas. Pintam repetidamente suas vilas, becos e calçadas. Mas eu, que faço aqui?


  • Anabel em seu dia de luz

    Anabel em seu dia de luz

    Quando perdi minha filha, pensei que jamais conseguiria escrever sobre ela…


  • Das afinidades familiares

    Das afinidades familiares

    Outra noite, com amigos. Fomos os últimos. Chovia, e começávamos a nos desejar – eu, que nunca sorria. 1 Meu pai, depois de sepultado, passou a parecer-se ainda mais comigo. No sofá da sala, era o meu duplo, um espelho de terra: o pequeno rádio repetindo-lhe os informes municipais, outra vez o breve repouso antes…


  • As sombras

    As sombras

    Parei para ler o que havia nas mãos de alguns e espantei-me, porque ali se resumiam os pensamentos que ocupavam suas mentes e eram as chaves de suas almas. Li sonhos absurdos, planos criminosos, memórias, esperanças. Em muitos encontrei paixões sem sentido, vergonhas, frustrações, cartas suicidas, segredos de família…


  • Autorretrato 23 (conto)

    Autorretrato 23 (conto)

    A desconhecida que me devassava atraiu-me também. Entre suas companheiras, outras não menos cativantes, não se destacava pela beleza. Eu via algo em sua figura e em seus gestos, uma vaga ansiedade.


  • Carta com sarcófagos

    Carta com sarcófagos

    Quarto-e-sala é como chamam esta cela. A palavra estrangeira soa um pouco mais alegre, mas claro que não a liberta nem altera seus limites. Nada há de especial neste cubículo onde às vezes sonho ou interpreto minhas solidões, exceto por uma porta extra no fundo da saleta em L. Que eu saiba, é o único…


  • Noite no jantar dançante

    Noite no jantar dançante

    Outros homens me viram passar pela porta lateral do salão de festas. Sei que me observaram de seus secretos desejos quando saí para o jardim aberto. Sentei-me sobre uns degraus de ardósia entre dois gramados, de altura conveniente. Tirei da bolsa o batom, revi meu rosto no pequeno espelho, meu pequeno rosto.


  • O engenheiro e os fungos

    O engenheiro e os fungos

    A vida não tem cura. Viver é estar doente de tempo.


  • Ante seus olhos, quase um silêncio

    Ante seus olhos, quase um silêncio

    Noite passada tornei a sonhar que a amava, e a conduzia por uns jardins impossíveis, enriquecidos de remansos, ramos inclinados e delicadas quedas d’água. Ela deita a cabeça em meu ombro, sorri com grande ternura enquanto caminhamos, o que me põe a despertar com um intenso desejo de possuí-la, como não menos o de destruir…